Os deputados Durval Amaral e Luiz Claudio Romanelli se licenciaram para ocupar cargo no governo, mas mantêm vantagens, como gabinete e verba de ressarcimento
As regalias que os secretários estaduais Durval Amaral e Luiz Claudio Romanelli ainda desfrutam na Assembleia Legislativa do Paraná, da qual se licenciaram dos cargos de deputado, são únicas no Brasil. Os dois, apesar de fazerem parte do Executivo, mantêm seus gabinetes e 19 funcionários no Legislativo, a um custo anual de pelo menos R$ 417,6 mil em salários – valor que pode até dobrar, caso sejam pagas gratificações. Em nenhuma das outras 26 assembleias legislativas do país foram localizados gabinetes montados para quem assumiu alguma secretaria. Segundo levantamento feito pela reportagem, cerca de 50 deputados estaduais estão nesta situação. Na Câmara Federal, da qual se licenciaram 46 parlamentares, também não é permitida a manutenção de gabinetes.
Além disso, Amaral e Romanelli ainda utilizam a verba de ressarcimento da atividade parlamentar, que subsidia gastos típicos do mandato. A cota de cada parlamentar é de R$ 15 mil mensais, sendo que o saldo não utilizado pode ser aproveitado nos meses seguintes. Em janeiro e fevereiro, os dois gastaram juntos quase R$ 48 mil com combustível, telefonia, refeições e gráficas. Ao longo deste ano, se eles mantiverem a média de gastos, vão pedir o ressarcimento de R$ 298,8 mil -- mas esse valor, pela lei, pode chegar a até R$ 360 mil.
Somando a verba de gabinete e os salários dos funcionários, o custo da estrutura dupla dos secretários será de pelo menos R$ 716,4 mil. Isso se não for paga nenhuma gratificação extra, o que pode até dobrar os salários. O valor representa um gasto duplo porque as cadeiras de Durval e de Romanelli na Assembleia foram ocupadas pelos suplentes Duílio Genari (PP) e Elton Welter (PT), respectivamente -- Welter deixou a vaga por decisão da Justiça para Gilberto Martin (PMDB). Ou seja, a Assembleia Legislativa, que tem 54 deputados, está usando dinheiro público para manter 56.
Comparação
A Gazeta do Povo já havia noticiado, na edição de 3 de março, que os dois secretários mantinham funcionários na Assembleia. Eles justificaram que a estrutura era necessária para atender suas bases eleitorais. Mas, conforme o levantamento feito pela reportagem nos legislativos estaduais e no Congresso nos últimos dias, nenhum dos cerca de 100 políticos que estão na mesma situação usam duplamente a estrutura pública.
Em São Paulo, por exemplo, os dois deputados estaduais mais votados, Bruno Covas (239,1 mil votos) e Paulo Barbosa (215 mil), ambos do PSDB, deixaram a Assembleia para assumir cargos no Executivo. O segundo mantém um escritório político para atender o eleitorado na sua base, em Santos. Segundo a assessoria de imprensa de Barbosa, a manutenção do local e o pagamento do salário de cinco funcionários “sai do bolso” do próprio tucano.
O uso da verba de gabinete também é vetado nos outros legislativos, conforme as informações prestadas pelas assessorias à reportagem. O único benefício dos paranaenses que se repete em outros estados é referente ao próprio salário. Muitos deputados que assumem secretaria optam pelo salário do Legislativo, que costuma ser maior do que o oferecido pelo Executivo. No caso do Paraná, os valores são de R$ 20 mil e R$ 18,9 mil, respectivamente.
Os dois secretários foram beneficiados pela Lei n.º 16.750/10, aprovada pela Assembleia em dezembro passado. Ela foi apresentada pelo ex-deputado Antonio Anibelli (PMDB) no dia 6, poucos dias depois de surgirem os primeiros boatos de que Romanelli ocuparia a Secretaria do Trabalho. Nesse mesmo dia, o próprio Romanelli deu parecer favorável ao projeto na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Ela foi aprovada pelo plenário no dia 15 e sancionada pelo ex-governador Orlando Pessuti (PMDB) no dia 29, dois dias antes do fim do mandato.
“Mesmo existindo uma lei, ela pode ser considerada contrária aos pilares da boa administração pública, como o zelo pelo dinheiro público e o princípio da eficiência”, observa o advogado Alessandro Balbi Abreu, presidente Comissão de Direito Eleitoral da OAB em Santa Catarina. Na opinião dele, Durval e Romanelli podem vir a ser responsabilizados pelo mau uso da verba pública. “O mandatário é responsável. O Ministério Público pode requerer a devolução do dinheiro hoje mesmo ou até no final do mandato.”
Entretanto, o advogado Luiz Armando Badin, especialista em Direito Público, pondera que a lei serve como “blindagem” aos secretários. “Esse tipo de norma não é comum no Brasil, e tem a constitucionalidade duvidosa. Mas é preciso fazer uma análise aprofundada antes de se falar em improbidade administrativa.” Segundo ele, é preciso verificar se a lei tem justificativa do ponto de vista do interesse público. “Claramente é uma lei corporativa que atende aos interesses dos deputados locais. Mas qual é a vantagem do poder público em custear gastos de um deputado que está licenciado, e que tem outra estrutura no Executivo?”